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domingo, 17 de março de 2013

Onde está o monstro?


O mago inexperiente repousava dentro de uma pequena tenda na floresta, reconfortado pelo ar morno da noite, quando ouviu o som de folhas secas sendo pisadas.

Devido ao sono leve, despertou rapidamente e ficou alerta. Mesmo a região estando em um período tranquilo, sem ataques inimigos, não era conveniente ficar menos atento em zonas não civilizadas.

Como adormeceu trajando a sua túnica, pegou apenas o seu cajado, através do qual canalizava as magias, e saiu para averiguar o que estava perturbando o seu sono.

—Lux – sussurrou, fazendo um feixe em forma de leque iluminar alguns metros a sua frente.

Ainda diante da tenda, deu um giro de trezentos e sessenta graus, com a luz acompanhando o seu olhar, para ter a certeza de que era apenas um pequeno animal que estava circulando por ali e não algo que fosse realmente motivo para preocupações.

Estava virando-se para entrar na tenda, afinal aquele foi um duro dia de trabalho em busca de uma planta raríssima que seu mestre precisava para um encantamento, quando ouviu o som de passos às suas costas. Imediatamente, encarou o que se aproximava e por muito pouco não gritou.

Há pouco mais de seis metros, enxergou um homem que vestia roupas de um nobre, mas estava sujo de terra. Os olhos dele pareciam mergulhados em sangue, a sua cabeça tinha apenas alguns tufos de cabelo e a pele era pálida como a de um cadáver. Quando a coisa sorriu, exibindo caninos protuberantes, confirmou a suspeita, era um vampiro.

Algumas dessas criaturas costumavam aparecer em reinos vizinhos, trazendo o pavor ao coração dos aldeões, mas ainda assim era em quantidade baixíssima, tornando-os uma praga facilmente exterminável por aqueles que manipulavam a magia.

Sem pestanejar, o aprendiz de mago conjurou uma redoma sagrada, clamando ao seu deus, que cobriu a si mesmo e mantinha o monstro estacionado.

O vilarejo ficava a cerca de três quilômetros, poderia sustentar a magia enquanto caminhava, garantindo a sua proteção contra o morto-vivo.

Quando recuou um passo, com a intenção de seguir a trilha para a sua casa, ouviu mais passos ao seu redor. Nesse momento, além do vampiro, viu uma corja de várias criaturas: lobisomens, zumbis, fantasmas, demônios e muitos outros que não soube classificar. Todos queriam um pedaço dele, as expressões não dissimulavam as intenções.

O jovem sabia que o seu mestre possuía muitos inimigos, mas nunca considerou que todos eles poderiam formar uma aliança e ainda mais atacar ao mesmo tempo. Eles estavam tirando vantagem do período de paz para criarem o elemento surpresa.

Sem saída, estabeleceu contato mental com o seu mestre, o mago mais poderoso que já existiu, gritando:

—Socorro, necessito de sua ajuda, monstros me espreitam e, com o medo se apoderando de meu coração, desconfio que a fronteira que me separa deles irá ruir!

O mestre disse apenas:

—Chegarei imediatamente.

O velho, profundo conhecedor dos mistérios arcanos, podia manipular o espaço e se teletransportar, portanto o aprendiz não se assustou com a súbita aparição ao seu lado.

—Não tenha medo, filho, o papai chegou – o homem acendeu a luz do quarto – O que foi? Monstros?

—Sim, papai, os monstros apareceram e eu me cobri com o lençol para me proteger deles, também me agarrei no meu ursinho e acendi minha lanterninha – disse o garoto de apenas cinco anos de idade.

—Não precisa ficar assim, você sabe que eu sempre vou lhe proteger – declarou abraçando o filho somente com o braço direito.

—Sempre, papai? – indagou a criança fazendo um bico com os lábios.

—Nunca vou lhe abandonar e qualquer monstro que se aproximar de você deve sentir medo, pois vai ter que se entender comigo! – acariciou a cabeça do menino com a mão direita, deixando a outra escondida em um bolso da calça jeans que usava.

—A mamãe também será protegida?

—Sim, a mamãe também – seus olhos pareciam dois abismos desprovidos de emoção – Ela não precisa temer mal algum... – mexeu os dedos da mão melada de sangue que estava ocultada.

Afagou o filho até que ele voltasse a dormir e lhe deu um beijo na testa, antes de sair do quarto para continuar o seu trabalho.

2 comentários:

  1. Muitas vezes tememos os monstros dos nossos sonhos e também dos nossos pensamentos, não percebemos que o verdadeiro monstro pode estar ao nosso lado. Creio que esse conto não necessite de mais comentários. Mais uma vez, parabéns!
    Abraços,
    Ana Luis

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    1. Ana, o pior monstro, ao menos se assim ele decidir, é o ser humano...nada assusta mais que a realidade. Obrigado por comentar mais uma vez :)

      Abraços!

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