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segunda-feira, 27 de maio de 2013

À prova de bala

    
  Eu tava voltando pra casa, era uma quarta-feira à noite, você sabe, eu saio as 9 da noite as quartas, não sabe? Como sempre, eu cortei caminho pela praça, só pra passar por perto da nossa árvore... Sempre quis gravar nossos nomes naquela árvore, mas nunca fiz isso, porque, sinceramente, é bem brega.
    Eu tava super empolgado aquele noite; iriamos sair na noite seguinte e eu tava esperando isso há muito tempo. Tá certo que a galera toda iria estar junto mas, era uma noite que passaríamos muito tempo juntos; eu e você. Mas... o destino, ou Deus, se preferir, não quis assim, não é? Ah... foi quando eu senti.
Primeiro me assustei (eu tava com os pensamentos muito longe), senti aquela ponta dura e gelada nas minhas costas. Dei um pulo de susto e tentei olhar para trás, mas ele me acertou um soco ou um tapa na nuca. Gemi de dor e ele ficou bravo, me mandou calar a boca e passar tudo. Tudo o que? Perguntei. Ele se irritou de novo e disse: Carteira, celular, tudo!
     Senti um aperto na garganta, meu estomago pulou e então, eu finalmente tinha entendido, era um assaltante com um revolver nas minhas costas. Sabe o que eu fiz? Exatamente como nossas mães e professores mandam: cooperei. Pedi pra ele ficar calmo, que não era preciso ficar nervoso, eu daria o dinheiro e o celular pra ele, e ele iria embora tranquilo e tudo ficaria bem.
     Acho que ele não gostou disso. Deve ter pensado que eu tava tirando com a cara dele. Acho que foi porque usei um tom de voz muito calmo. Eu tava lutando pra me manter calmo, e não queria morrer, eu queria muito te ver de novo, te encontrar no nosso encontro, que seria dia seguinte. Eu iria sobreviver pra ver seu sorriso de novo.
Quando ele pegou minha carteira, eu perguntei:posso ir agora? Mais uma vez eu acho que irritei ele. Foi então que... eu senti, a pior dor fisica que eu já senti na vida. Ele me acertou um tiro nas costas. Sabe, um tiro doi demais. Toda força das minhas pernas sumiram num instante, parecia um brinquedo quando acaba a pilha e desaba sem forças.
     Meu rosto estava colando na grama molhada, eu sentia a terra umida na minha boca e nas minhas mãos. Nem ao menos vi o rosto dele... Meu coração tava tão acelerado... eu estava morrendo, a vida estava escapando do meu corpo a cada segundo. Eu precisava viver! Eu precisava voltar aqui e te ver! Me recusei a morrer. Gemendo pela dor, eu comecei a me arrastar, ou tentar me arrastar; enfiava minhas unhas na grama, cavando a terra e me puxava para frente, se eu encontrasse ajuda, talvez eu ainda pudesse ser salvo. Era tudo que eu conseguia pensar na hora.
     Lembro das luzes dos postes da rua; iluminava muito mal, eu não conseguia ver direito pra onde ia, e quanto mais eu tentava me arrastar, mais escuro as coisas ficavam à minha volta. Não era falta de luz. Não. Era a morte chegando. Mesmo cego, eu continuei puxando o corpo para frente, como um zumbi do Walking dead, um cadáver que não sabe que morrer e se prende ao único impulso de se jogar pra frente. Minha visão estava toda escura e os barulhos da rua estavam cada vez mais distantes, enquanto aquela bala me queimava como fogo do inferno nas costas. E ai, eu te vi.
    Sei que não era você mesmo, era alucinação minha, eu vi seu rosto na minha frente, seu rosto, no meio das trevas que me cercavam. Voce pode até rir, mas te ver sorrindo pra mim, renovou minhas forças para continuar. Levantei a cabeça e gritei, (ou tentei gritar) e voltei a me arrastar. Quando senti que minhas mãos tocaram a calçada, desabei, sem mas força alguma.
     Quando eu abri os olhos, eu tinha certeza que tava morto... Mas eu não estava. Eu tava no hospital, tinha um medico e uma enfermeira do meu lado. Perguntei se ali era o céu e eles deram risada. O medico me disse que foi salvo por um milagre. Um milagre, acredita? Que minha vontade de viver era absurda e que um tiro daquele poderia facilmente ter me matado, mas eu estava ali, vivo e recuperado, nem ao menos um ponto vital tinha sido acertado.
    Mais tarde vi meus pais. Pedi para te ver e falar com você, mas me disseram que você tinha viajado. Minha mãe não parou de falar em Deus e m milagre, mas sabe, não foi nem Deus, nem milagre. Eu fui salvo por você. Minha vontade de viver e voltar a te ver foi o que me impediu de morrer. Meu amor por você, Gabriela, foi o que não me deixou partir para sempre, você entende isso?
    E quando eu me recupero, eu compro o buquê de rosas mais lindo da floricultura, venho até a sua casa...e o que eu vejo? Você beijando o Paolo? Sério... PAOLO? Justo ele?? Eu me senti tão... idiota! Tão... revoltado... meu coração estava partido em milhões de pedaços... Você se quer chegou a sentir minha falta? Ou será que já estavam saindo há muito tempo e só o idiota aqui que não viu? Porque Gabi, porque? Porque fez isso comigo? O que sobrou de mim agora?

   A moça lutava para se soltar das amarras. Estava amarrada numa cadeira de madeira. Um pano na boca a impedia de gritar. Seu rosto estava todo vermelho de tanto chorar. Soluçava e tremia em pânico.
    Ele estava sentado à frente dela, numa poltrona, na sala da casa dela. Ele estava com lágrimas nos olhos também, parecia irritado e triste ao mesmo tempo.
     Do bolso da jaqueta, ele puxa um revolver 38.
  Gabriela arregalou os olhos, tentando gritar e se soltar. Ele levantou-se e caminhou para trás dela, lentamente. Ela ouviu o barulho da arma sendo engatilhada.

- Eu entendo que não me ame como eu te amo. Mas se quer mesmo ficar com o Paolo, tem que ser pra sempre, tem que ter certeza que ele é o cara certo.

   Ela sentiu o cano da arma tocando-a nas costas. Tentava implorar para que ele parasse, mas as palavras não lhe saiam da boca.

- Vamos ver o quão forte é o seu amor por ele, Gabi. Se a vontade de voltar a vê-lo for maior que a dor da bala, então,você vai sobreviver como eu. Agora... se ele não for seu verdadeiro amor... bom, é melhor nem pensar nessas coisas, não é?


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