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sábado, 6 de julho de 2013

Ritos

  
 Ele sentiu os músculos se retraírem levemente... Devagar, podia sentir o movimento voltando aos dedos dos pés e das mãos.
  Sua consciência voltava lentamente de um sono profundo, cujos sonhos ele mal podia se lembrar. Estivera dormindo por quanto tempo? Também não lembrava da noite anterior...
  Moveu os braços para espreguiçar-se e no mesmo momento sentiu o corpo todo ser percorrido por uma dor lacinante que começava perto da garganta e seguia ao longo do peito até a pélvis.
  Recuperando lentamente o ritmo da respiração, alarmada pela dor, abriu os olhos. Sentia as pálpebras pesadas e a cabeça rodando, mas tudo era escuridão. Tentou levantar o braço que bateu em algo a cerca de 30 centímetros acima, e sentiu mais uma fisgada de dor corrente, tocou o peito e algo lhe pareceu muito mal...
Pôde sentir um profundo corte que seguia da base do pescoço até abaixo do umbigo, seus dedos tocavam os pontos, feitos espaçadamente, sem cuidado, e isso lhe causava mais dor e com ela sentia náuseas. Não enxergava nada, tudo era oculto.
  Tentou novamente erguer os braços, mas era impedido por uma parede de madeira...
  O desespero tomava conta dele, tentou chutar, mas a parede não cedia e só lhe fazia aumentar a dor que sentia, logo percebeu que a parede se fechava estreita à sua volta... Estava encaixotado!
  Tentou gritar, chamar por alguém, mas seu coração disparara e sua voz faltara.
  "Meu Deus, eu fui enterrado vivo! VIVO! Mas como? Eu não morri! Eu não me lembro! Como, Meu Deus? COMO? ... "
  Ele começou a empurrar com os joelhos e as mãos, mas a flexão das pernas fez os pontos na sua barriga rasgarem a pele, causando-lhe tamanha dor que o ar também lhe faltou. Podia sentir as lágrimas escorrendo... Fora autopsiado, não sabiam a causa de sua morte.
- Alguém... - murmurou ele, a voz baixa, rouca, somente um sopro.
  De repente o caixão se moveu. Alguém estava ali, levando o caixão, mas ele deslizava...
"Será meu funeral? Ainda não me enterraram!!! Ainda há tempo!"
  O sangue na barriga escorrendo e molhando suas costas, não tinha forças mais para empurrar... As batidas mal faziam som nas laterais do caixão, sentia a cabeça rodar e latejar.
- Socorro...
  Lentamente as lembranças voltavam, do jantar, da noite com ela, o café na cama, o chuveiro, a tontura... e o nada.
  "É isso! Eu desmaiei! Mas como ela não viu que era um desmaio? Será que eu bati a cabeça? Oh Deus! Eu tenho Catalepsia? Como os médicos não viram isso??? Me abriram todo e não viram isso?"
- Socorro... Ajuda...
  No exato segundo entre a última tentativa de pedir auxílio e tentar organizar seus pensamentos em meio aquela dor insuportável e o desespero, sentiu os pés esquentarem...
  No lado de fora, seus parentes, amigos e colegas, choravam sua morte e despediam-se pela última vez do amigo que desde sempre dizia:
"Quando eu morrer, quero ser cremado, igual aos povos antigos! E minhas cinzas quero que joguem sobre o mar..."

por Thaís Rossi

13 comentários:

  1. Realmente foi surpreendente, foda mesmo!

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  2. Nossa. Tenso isso. Sempre acho que isso pode acontecer. x-x Por isso que eu quero que meu velório seja duradouro. :x Parabéns pelo conto. =D

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    1. Pois é né? Eu quero ser cremada... Mas né? rsrs Obrigada João!!!

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  3. Bota tenso nisso, quando eu li fiquei intrigada com o que haviam feito a ele >_<
    Parabéns Thaís, ficou muito muito legal!

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  4. Cara, muito bom mesmo... *_*
    li o finalzinho de novo p/ lembrar q eu me senti na pele dele... hhAHAha
    O_O


    Quero mais :x
    (aquelas hauhaUHa)

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  5. Bom texto. Quanto a cremação, não se preocupe, se estiver viva com certeza vão perceber pois apenas o corpo é queimado, o caixão não.

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    1. Depende. Existem crematórios que sim, cremam só o corpo, outro usam o caixão e outros colocam o corpo em uma caixa de papelão!
      Mas não estou pensando muito nisso... rsrsrs

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  6. Tu escreves muuuito bem! Transmite com incrível precisão cada detalhe da situação do personagem. Fiquei no lugar dele com certeza! Bah Thaís... mais uma vez, Parabéns! !!! Escreve mais!!!!!!

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    1. Poxa, obrigada mesmo! *_* Se um dia vier mais alguma idéia eu escrevo sim! ^^

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